Ao analisar o trabalho elaborado pela equipa laranja, no âmbito da actividade1, reparei na definição de estudo de caso que apresentaram. Considerei-a muito interessante, pelo que decidi aprofundar um pouco mais esta modalidade de investigação.
Tentei fazê-lo com base no seguinte livro:
BASSEY, M. (1999). Case Study Research in Educational Settings. Buckingham: Open University Press.
Nesta primeira fase, interessei-me, sobretudo, pelo terceiro capítulo, What is case study? (pp.22-36).
Segue o resumo que fiz durante a minha leitura:
Para justificar a importância deste capítulo, Bassey cita Lincoln e Guba: ‘While the literature is replete with references to case studies and with examples of case study reports, there seems to be little agreement about what a case study is.’ (p.22) – portanto, não parece haver uma definição consensual de ‘estudo de caso’.
Aliás, em 1975 foi organizada uma conferência em Cambridge, com o título ‘Methods of case study in educational research and evaluation’. O objectivo da conferência era começar a elaborar um manual sobre os princípios, procedimentos e métodos do estudo de caso na educação. No entanto, o objectivo não foi cumprido porque não conseguiram clarificar os pressupostos epistemológicos e teóricos do estudo de caso na investigação educacional.
Desde então, têm surgido diversas tentativas de definir o estudo de caso (pp.24-27):
1- MacDonald e Walker (1975): ‘Case-study is the examination of an instance in action. The choice of the word ‘instance’ is significant in this definition, because it implies a goal of generalization. We might say that case-study is that form of research where n = 1, only that would be misleading, because the case-study method lies outside the discourse of quantitative experimentalism that has dominated Anglo-American educational research (…) Case-study is the way of the artist, who achieves greatness when, through the portrayal of a single instance locked in time and circumstance, he communicates enduring truths about the human condition.’ [o objectivo é generalização mas sem o discurso do experimentalismo quantitative; beleza da ideia da mensagem do artista]
2- Cohen e Manion (1980): ‘Unlike the experimenter who manipulates variables to determine their causal significance or the surveyor who asks standardised questions of large, representative samples of individuals, the case study researcher typically observes the characteristics of an individual unit – a child, a clique, a class, a school or a community. The purpose of such observation is to probe deeply and to analyse intensively the multifarious phenomena that constitute the life cycle of the unit with a view to establishing generalisations about the wider population to which that unit belong.’[o objectivo é a generalização]
3- Kemmis (1980): ‘Such language might seem odd, but it makes explicit the cognitive and cultural aspects of case study research. It reminds us of the role of the researcher in the research: s/he is not an automaton shorn of human interests and programmed to execute a design devoid of socio-political consequences. It reminds us that knowledge is achieved through objectivisation: much as we may prefer to think otherwise, research is not a process of thought going out to embrace its object as if its object lay there inert, waiting to be discovered. And it reminds us of the active and interventive character of the research process: much as we may prefer to think otherwise, research is not merely the application of sophisticated techniques and procedures which yield up true statements as if we did not have to decide which techniques to use in which situations and how they must be modified to suit the particular conditions of any study.
The intertwined processes involved in the conceptualisation of a research problem, the investigation, the interpretation of findings and their application in the world beyond the study must be carried out with as much caution, rigour and compassion as the circumstances of each allow. In naturalistic research, these processes are especially ‘visible’: decisions about how they are realised in a study will very often affect life in the situation being studied. And often the decisions are taken ‘on the spot’, without the luxury of cool and considered reflection away from the real-life exigencies of the situation.
The imagination of the case and the invention of the study are cognitive and cultural processes; the case study worker’s actions and his/her descriptions must be justified both in terms of the truth status of his/her findings and in terms of social accountability. Social science has the unique problem of treating others as objects for study; the unique problem in case study is in justifying to others why the researcher can be a knowledgeable observer-participant who tells what s/he sees.’ [foca os deveres, as responsabilidades e as oportunidades do investigador; o facto das suas decisões em relação ao estudo de caso resultarem do seu processo cognitivo e cultural e, por outro lado, influenciarem a própria situação em estudo; investigador como observador-participante.]
4- Stenhouse (1985): ‘Case study methods involve the collection and recording of data about a case or cases, and the preparation of a report or a presentation of the case… Sometimes, particularly in evaluation research, which is commissioned to evaluate a specific case, the case itself is regarded as of sufficient interest to merit investigation. However case study does not preclude an interest in generalisation, and many researchers seek theories that will penetrate the varying conditions of action, or applications founded on the comparison of case with case. Generalisation and application are matters of judgement rather than calculation, and the task of case study is to produce ordered reports of experience which invite judgement and offer evidence to which judgement can appeal.’ [foca os métodos; generalização e aplicação como objective do investigador; visa a produção de um texto que convida ao julgamento (generalização) e que contenha as evidencias para o sustentar;]
5- Sturman (1994): ‘Case study is a generic term for the investigation of an individual, group or phenomenon. While the techniques used in the investigations may be varied, and may include both qualitative and quantitative approaches, the distinguishing feature of case study is the belief that human systems develop a characteristic of wholeness or integrity and are not simply a loose collection of traits. As a consequence of this belief, case study researches hold that to understand a case, to explain why things happen as they do, and to generalise or predict from a single example requires an in-depth investigation of the interdependencies of parts and of the patterns that emerge.’ [primeira definição, entre este grupo de definições, a aceitar tanto a abordagem quantitativa como a qualitativa; foca a importância da investigação aprofundada da interdependência das diversas partes do caso – perspectiva holística que permite generalização]
6- Yin (1994): ‘[case study] • investigates a contemporary phenomenon within its real-life context, especially when
• the boundaries between phenomenon and context are not clearly evident. (…)
• copes with the technically distinctive situation in which there will be many more variables of interest than data points, and as one result
• relies on multiple sources of evidence, with data needing to converge in a triangulating fashion, and as another result
• benefits from the prior development of theoretical propositions to guide data collection and analisys.’ [foca o aspecto do contexto real; foca necessidade da triangulação;]
7- Stake (1995): ‘Louis Smith, one of the first educational ethnographers, helped define the case as ‘bounded system’, drawing attention to it as an object rather than a process. Let us use the Greek symbol theta to represent the case, thinking all the while that theta has a boundary and working parts… The case is an integrated system. The parts do not have to be working well, the purposes may be irrational, but it is a system. Thus people and programs clearly are prospective cases. Events and processes fit the definition less well.’ [apresenta o caso como sistema integrado e limitado]
Também no que diz respeitos aos diversos tipos de estudos de caso não parece haver consenso:
Stenhouse, em 1985, apresenta quatro tipos abrangentes de estudos de caso – etnografia, estudos de caso avaliativos, estudos de caso educacionais e estudos de caso acção-investigação.
Yin, em1993, considera existirem três formas diferentes de estudos de caso – exploratório, explicativo e descritivo.
Stake, em 1995, faz a distinção entre estudos de caso intrínsecos (estudar o caso por si mesmo, sem preocupação com os resultados) e estudos de caso instrumentais (estudar um ou mais casos para tentar entender algo que vai além do caso propriamente dito).
A generalização também é abordada de formas diferentes:
Cohen e Manion vêem a generalização como objectivo do estudo de caso.
Yin também a considera muito importante, refere a generalização analítica (em oposição à generalização estatística).
Adelman et al. definem três tipos de generalização: da situação particular para uma classe; da situação particular para uma variedade de classes; generalizações sobre o caso em si mesmo, não considerando a relação situação particular-classe.
Stenhouse realça a generalização retrospectiva (em oposição à prognóstica, feita a partir do estudo de amostras).
Stake distingue entre pétites généralisations e grandes généralisations.
Ao longo dos anos os estudos de caso tiveram de lutar contra acusações de falta de rigor; de não ter bases para generalizações científicas; de serem muito demorados; de resultarem em quantidades dificilmente manuseáveis de informação; de poderem transformar-se numa intervenção incontrolável na vida dos outros; de poderem dar uma perspectiva distorcida do mundo.
Helen Simons, em 1996, destaca a natureza paradoxal do estudo de caso: o estudo da singularidade e a procura da generalização – ‘What we have is a paradox, which if acknowledged and explored in depth, yields both unique and universal understanding.’ (p.36)
Comentário: De facto, na essência do estudo de caso parece mesmo estar este paradoxo entre o singular e o geral, o único e o universal. A ligação entre estes extremos é feita do estudo aprofundado do particular que vai fornecer evidências para a generalização. Esta generalização, como pode ser depreendido da multiplicidade de tipos de generalização defendida por diversos autores, é complexa e encerra em si muitos perigos que podem retirar a credibilidade ao estudo. (daí a importância da triangulação dos dados)
Outro aspecto que me parece importante é que o investigador tem de ter a noção de dois aspectos fundamentais: 1) ele próprio traz consigo uma ‘bagagem’ cultural e cognitiva que ditam as decisões que toma relativamente ao estudo; 2) a sua acção, como investigador (segundo alguns autores, observador-participante) vai causar alterações na situação em estudo.
Apesar da complexidade deste método de investigação, parece-me muito interessante! É uma hipótese a ponderar!
sábado, 28 de junho de 2008
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1 comentário:
Muito interessante esse formato de organizar as idéias. Vou recortar, colar, reler.
L.E.
www.luizeduardo.net
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