segunda-feira, 30 de junho de 2008

Estas fontes não secam...

O grande objectivo desta unidade curricular de Investigação Educacional é preparar os mestrandos para a sua próxima etapa: a dissertação.
Neste sentido, considero que todos os temas abordados e todas as actividades desenvolvidas foram pertinentes.

A metodologia adoptada pelas duas docentes foi adequada, uma vez que proporcionou situações de aprendizagem diversificadas. De destacar também a importância do apoio prestado em situações de alguma dificuldade (p. ex. aquando da actividade 5).

Gostaria de salientar a importância dos trabalhos em equipa. Foi no espaço da equipa que aconteceram os momentos mais significativos de debate, de troca de ideias e de colaboração.

Quanto à construção do webfólio, cabe-me esclarecer alguns aspectos:
1- Tal como referi no post de abertura, trata-se de um ambiente novo para mim. Como tal, levei algum tempo para conseguir entender as suas potencialidades.
2- Decidi nele publicar os apontamentos que fiz da leitura de alguns artigos científicos que mais marcaram o meu percurso nesta UC. Os artigos estão todos identificados com as respectivas referências bibliográficas e os apontamentos são completados, no final, com um comentário pessoal sobre a sua relevância ou sobre alguma reflexão que me tivessem suscitado. Em muitos dos apontamentos fui registando, pelo meio, comentários que me pareceram pertinentes.
3- Fiz uma reflexão sobre o percurso de cada uma das actividades, focando alguns aspectos essenciais sobre as temáticas em estudo, o desenvolvimento da actividade e a minha participação.
4- Disponibilizei no espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’ os recursos que mais enriqueceram o meu percurso.
5- Senti a necessidade de dar um sentido de unidade ao webfólio (que não exclusivamente o conteúdo da investigação educacional). Neste sentido, tentei estruturá-lo e organizá-lo tendo em conta o seu título ‘Das Fontes ao Mar’. Também os pequenos apontamentos poéticos servem, por um lado, para contribuir para essa unidade e, por outro, para funcionarem como ‘pequenas ilhas’ dentro do mar dos conteúdos da investigação educacional.
Considero que o meu webfólio revela o trabalho que desenvolvi durante este semestre e que cumpriu a sua finalidade principal de ser um meio de reflexão sobre minha aprendizagem.

Em jeito de auto-avaliação, tenho a consciência de ter aprendido imenso nesta unidade curricular, mas, acima de tudo, apercebi-me da complexidade inerente à investigação educacional, estando alertada para as inúmeras dificuldades e armadilhas que irei encontrar no meu caminho.
Penso que todo o meu percurso se pautou por uma postura ética nas actividades desenvolvidas. Procurei partilhar os meus conhecimentos e dúvidas, tentei contribuir para a coesão do grupo e colaborar com todos os colegas.

Resta-me agradecer a todos os colegas e às docentes o papel fundamental que desempenharam no meu desenvolvimento pessoal nesta unidade curricular.

Um abraço a todos!

Salpico de poesia

Da água

Não há senão um leito rente à terra
a luz vacilante de pássaros
os olhos atravessados pelos juncos
o lenço pequeno e íntimo
que levamos à boca para não esquecer
como era quente e masculino o coração da água.
(Eugénio de Andrade)

Reflexão sobre o decurso da actividade 6, ‘Questões éticas na investigação educacional’, inserida na temática 5, ‘A ética do investigador’

Esta actividade centrou-se na importância das questões éticas ao longo de todo o desenvolvimento de um estudo investigativo.
Este tema já tinha surgido na actividade 1, quando em trabalho de equipa (azul), decidimos abordar, sucintamente, as questões éticas na nossa reflexão sobre as etapas de um projecto de investigação (já aqui tínhamos a ideia de que existem questões éticas a serem ponderadas em todas as etapas). Nesse sentido, transcrevo aqui uma intervenção que publiquei a 6 de Abril (23:24h), na nossa reflexão sobre as questões éticas:
‘Olá a todos!
__________, quando estive a navegar site do Educational Research fiz estes apontamentos que poderão ajudar na abordagem à questão da ética:
Sobre as questões da ética na investigação:
(Educational Research)
Há três abordagens à ética:

- deontológica (código universal)
- cepticismo ético (não se consegue formular códigos morais concretos e invioláveis)
- utilitário (os benefícios justificam os riscos?)
Há três grandes áreas de preocupação da ética:
- a relação entre a sociedade e a ciência
- aspectos profissionais (actividade fraudulenta; publicação parcial ou duplicada)
- forma de tratamento dos participantes
Conduta ética na investigação com seres humanos:
- autorização esclarecida
- esclarecimento total
- liberdade de desistirem
- protecção de riscos físicos e mentais
- confidencialidade vs. anonimato

De Bogdan & Biklen (1994:75-78) resumi o seguinte:
Duas questões dominantes a investigação com sujeitos humanos:
- sujeitos aderem voluntariamente, tendo conhecimento da natureza do estudo e dos perigos e das obrigações;
- sujeitos não são expostos a riscos superiores aos ganhos que poderão surgir do estudo.
Os princípios éticos podem ser diferentes, consoante os projectos de investigação.
Os autores apresentam os seguintes princípios como mais gerais:
- As identidades dos sujeitos devem ser protegidas;
- Os sujeitos devem ser tratados respeitosamente e de forma a conseguir sua cooperação;
- Antes de obter a autorização dos sujeitos, o investigador deve esclarecer todas as dúvidas e os aspectos acordados devem ser cumpridos;
- Autenticidade dos resultados, mesmo que não agradem ao investigador.
Como já tinha isto alinhavado (foi só passar para a minha pasta das intervenções em fórum e formatar), aqui fica. Pode ser que te ajude.’
Participação no fórum geral:

Esta actividade foi desenvolvida em regime individual, assente na análise da bibliografia disponibilizada pelas docentes – American Educational Research Association – Ethical Standards (disponível a partir do espaço ‘Gogos, Conchas e pérolas’) - e em outras pesquisas efectuadas.
Foi aberto um fórum geral de discussão. Aí foram colocadas as ideias gerais constantes da bibliografia facultada. Mas, na sua maioria, as diferentes intervenções enriqueceram o debate com ideias resultantes de outras fontes.
Também eu tentei participar com novas perspectivas e ideias, tendo por base um artigo de Marquez-Fernandez
[1] e o site do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (ambos disponíveis a partir do espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’).
Deste modo, foi-me possível contribuir para o debate com ideias fundamentadas e novas perspectivas, em diversas linhas de discussão. Simultaneamente, penso que ficou clara a minha identificação das ideias principais desta temática.


Em síntese, foi uma actividade que me permitiu aprofundar um aspecto que, em equipa, já havia sido abordado uns meses antes. Ficou reforçada a ideia de que em todas as suas acções/decisões, o investigador tem de tomar decisões éticas, que por vezes podem ser difíceis. Parece-me particularmente importante a noção de que as questões éticas na investigação são de ordem transdisciplinar e que é a ética que impõe os limites à ciência/investigação, para que ela não se torne um fim em si mesma, mas sim um meio de fomentar o bem-estar da Humanidade.

[1] MÁRQUEZ-FERNANDES, A. (2001). La ética del investigador frente a la producción e difusión del conocimiento científico. In Revista Venezolana de Gerencia, año 6, nº16 (pp.636-650).

Salpico de poesia

De longe vejo passar no rio um navio...
Vai Tejo abaixo indiferentemente.
Mas não é indiferentemente por não se importar comigo
E eu não exprimir desolação com isto...
É indiferentemente por não ter sentido nenhum
Exterior ao facto isoladamente navio
De ir rio abaixo sem licença da metafísica...
Rio abaixo até à realidade do mar.
(Alberto Caeiro)

Algumas questões éticas sobre a investigação

No sentido de aprofundar as minhas ideias sobre a ética na investigação, li o artigo ‘La ética del investigador frente a la producción e difusión del conocimiento científico’ de Álvaro Márquez-Fernandez[1] (pode ser consultado a partir do espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’).
Ficam aqui alguns apontamentos que resultaram da minha leitura:

No seu artigo, o autor abrange as diversas dimensões da ética na investigação, apresentando uma listagem de situações possíveis de falta/ausência de ética na investigador e alertando para o facto de que ética depende sempre do investigador, dos seus princípios, interesses,... [este último aspecto parece-me particularmente interessante, uma vez que, deste modo, dois investigadores que estudem um mesmo aspecto poderão ter atitudes e, consequentemente, resultados completamente diferentes – basta para isso, que um condicione algum aspecto da sua investigação por razões éticas]
Assim, o autor defende que a ética é a garantia da credibilidade do novo conhecimento científico apresentado e da aplicação humanitária deste. [ideia próxima da defendida pela Comissão Nacional de Ética para as Ciências da Vida! – ver post sobre do decurso da actividade 6]
A ética serve, portanto, para definir a forma de actuar, de produzir e de difundir o conhecimento científico [novamente a totalidade do processo], para bem da Humanidade, respeitando a liberdade, a originalidade e a criatividade do investigador, mas também as dos outros membros da comunidade científica.
O cumprimento destes valores éticos depende, no entanto, de uma complexidade de aspectos, pois não é algo espontâneo do investigador (não é uma disposição natural). Deste modo, a atitude ética depende de uma teia das relações sociais que define o perfil ético do investigador. [a definição da ética na investigação é, portanto, uma construção social]
Como exemplos de situações em que existe falta/ausência de uma atitude ética o autor refere (p. 643): escamoteamento e manipulação de referências bibliográficas; a paráfrase de uma ideia de outro autor; o plágio parcial ou total de um texto de outro autor; o desrespeito pelas normas de apresentação de um artigo (ex. a exclusividade de um artigo numa determinada revista); a aquisição de estudos (ex. o investigador paga a alguém para desenvolver um estudo que depois publica em seu nome), a coacção de um membro do júri de avaliação de um estudo. Máquez-Fernandez considera, portanto, que existem muitas maneiras diferentes de se ter uma postura antiética em investigação.
A certa altura, o autor compara a postura do investigador à do professor: considera que em ambos os casos, a postura ética vai além do cumprimento de um código de normas – trata-se de algo muito mais complexo, pois trata-se de algo que depende fortemente do desenvolvimento moral do investigador e do professor.

Comentário:
Considero que este artigo veicula bem a ideia da ética como norteadora de todo o processo de investigação – ela serve de travão e de bússola, pois, por um lado, delimita a acção do investigador, por outro, ajuda-o na descoberta de caminhos a seguir na sua investigação.

[1]MÁRQUEZ-FERNANDEZ, A. (2001). La ética del investigador frente a la producción e difusión del conocimiento científico. In Revista Venezolana de Gerencia, año 6, nº16 (pp.636-650).

Salpico de poesia

Água que à água torna...

Água que à água torna, de luz franjada,
Abre-se a vaga em espuma.
Movimento perpétuo, arco perfeito,
Que se ergue, retomba e reflui,
Onda do mar que o mesmo mar sustenta,
Amor que de si próprio se alimenta.
(José Saramago)

Reflexão sobre o decurso da actividade 5, ‘A análise quantitativa e qualitativa de dados’, inserida na temática 4

Esta actividade estava dividida em três fases:
1- o estudo individual sobre as técnicas de análise quantitativa de dados, aplicando esses conhecimentos a um problema concreto apresentado pelas docentes. Como recursos de aprendizagem foram disponibilizados Guides for good statistical practice (disponível para consulta a partir do espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’) e outros documentos da autoria das docentes da unidade curricular.
2- O estudo individual sobre as técnicas e análise qualitativa de dados, aplicando esses conhecimentos a um problema concreto apresentado pelas docentes. Como recursos de aprendizagem foram disponibilizados Qualitative content analysis (disponível para consulta a partir do espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’) e outros documentos da autoria das docentes da unidade curricular.
3- Discussão em fórum geral sobre as técnicas analisadas.
Fase 1:

Esta foi, sem dúvida, a actividade que mais dificuldades me levantou. Nunca estudei estatística. O meu primeiro contacto (para além daquele diário com dados estatísticos apresentados nos noticiários e jornais ou da elaboração de grelhas para avaliação dos meus alunos com indicação da moda, média e mediana), foram a leitura e a consequente sistematização dos respectivos capítulos de Educational Research (ver post antigo e o espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’).
Deste modo, a primeira reacção à leitura dos recursos disponibilizados e do problema colocado foi: ‘Não consigo fazer isto – não percebo nada de estatística!’. (In)felizmente houve mais colegas que tiveram a mesma reacção, pelo que as docentes (e alguns colegas com conhecimentos de estatística) forneceram mais alguma documentação que veio a facilitar um pouco mais a resolução da actividade.
Foi a partir desses documentos que tentei superar o meu choque inicial e me atrevi a esboçar uma proposta de resolução.
Não tenho qualquer noção se o que fiz está minimamente correcto, no entanto, parece-me importante incluir as minhas conclusões aqui neste webfólio – independentemente da sua qualidade, são o marco do meu primeiro embate com a estatística:
Problema:
Coloque-se na “pele” da investigadora que realizou a investigação Setúbal, as TIC e o ensino de inglês: atitudes dos professores. Analise os dados publicados e os itens do questionário aplicado. Suponha que depois de recolhidas as respostas ao questionário, tal como é descrito na dissertação, resolvia explorar os dados para além de uma análise descritiva.
- ‘para além de uma análise descritiva’ obriga à utilização de técnicas de estatística inferencial.

1) Pretendia saber se havia alguma relação entre as finalidades da utilização do computador (concretamente perguntas 16 a 21) e a frequência diária ou quase diária de utilização do computador (pergunta 28).
Qual o teste estatístico que faria?

- estamos, portanto, à procura de uma relação (→ estatística inferencial);
- uma vez que não há o cumprimento da totalidade das exigências para um teste paramétrico (a escala é nominal) → teste não paramétrico;
- tratando-se de uma escala nominal, temos duas possibilidades de testes não paramétricos: Teste de Chi quadrado ou Coeficiente de Contingência;
- como pretendemos verificar a hipótese de associação entre variáveis (ligação entre a finalidade e a frequência de utilização das TIC) → Coeficiente de Contingência;

Comentário: esta é a conclusão a que chego através da leitura dos materiais disponibilizados – no entanto, não tenho a noção de que modo os dados são ‘manuseados’, isto é, se podemos, simplesmente, pegar nas totalidades apresentadas: nas questões sobre a finalidade, podiam ser assinaladas várias respostas; na questão sobre a frequência, somente uma – esses dados podem ser directamente relacionados?

2) 99 professores indicaram que nunca utilizaram computador com os alunos. Poder-se-á dizer que os professores que nunca utilizaram o computador tendem a ser os que indicam que se sentem constrangidos a usar as TIC frente aos alunos (pergunta 101), ou os que indicam que o uso das TIC na sala de aula exige novas competências por parte dos professores (pergunta 105), ou os que indicam que os conteúdos da Internet não se adequam à disciplina (pergunta 107) ou ainda os que indicam que as TIC não melhoram a aprendizagem de Inglês (pergunta 112)?
Que testes estatísticos faria para verificar as hipóteses colocadas?
Que nível de significância pensaria adequado para estes testes?

- Estamos, novamente, à procura de uma relação (→ estatística inferencial);
- Olhando para o problema, penso que terão de ser feitos 4 testes do mesmo tipo, relacionando respectivamente os ’99 professores que nunca utilizaram o computador’ i) com a pergunta 101; ii) com a pergunta 105; iii) com a pergunta 107; iv) com a pergunta 112;
- também aqui não estão cumpridas todas as exigências para um teste paramétrico (a escala é ordinal) → teste não paramétrico;
- tratando-se de uma escala ordinal, temos duas possibilidades de testes não paramétricos: Teste-U de Mann-Whitney ou Correlação de Spearman;
- como pretendemos verificar se dois valores se encontram relacionados (4 combinações diferentes) → Correlação de Spearman;
- segundo as leituras efectuadas, para rejeitar uma hipótese nula (H0), o nível de significância α terá de ser igual ou inferior a 0,05; se isso se verificar, então podemos aceitar a hipótese alternativa (H1), aquela que estamos a testar, como verdadeira.

Comentário: também nesta questão a conclusão a que chego resulta do meu entendimento da leitura dos materiais disponibilizados – também neste caso não entendo como os valores são ‘manuseados’, que fórmula lhes é aplicada, ou como a ligação é estabelecida.

3) Analise os dados encontrados e que estão expostos na dissertação. Gostaria ainda de colocar outras hipóteses de relações entre esses dados? Explicite uma dessas relações e indique qual o teste estatístico que consideraria adequado para verificar essa relação.
Penso que seria interessante analisar a relação que pode haver entre os professores que assinalaram somente a questão 51 (formação generalista nas TIC), os que assinalaram somente a 52 (formação específica para a disciplina nas TIC) e os que analisaram a 51 e a 52 com as respostas que são dadas às questões 71 (utilização das TIC com os alunos) e 73 (frequência de utilização das TIC com os alunos). A ideia da análise seria verificar se existe alguma diferença entre os grupos de professores com formação generalista, específica ou ambas quanto à utilização das TIC com os alunos e a frequência dessa utilização.

- estamos, portanto, à procura de uma relação (→ estatística inferencial);
- também aqui não estão cumpridas todas as exigências para um teste paramétrico (a escala é ordinal) → teste não paramétrico;
- tratando-se de uma escala ordinal, temos duas possibilidades de testes não paramétricos: Teste-U de Mann-Whitney ou Correlação de Spearman;
- como pretendemos fazer uma comparação entre duas amostras (será que podemos considerar os subgrupos da amostra como amostras?) para verificar se há diferenças estatisticamente significativas → Teste-U de Mann-Whitney.

Comentário: também nesta questão a técnica proposta resulta do meu entendimento da leitura dos materiais disponibilizados – também neste caso não entendo como os valores são ‘manuseados’, que fórmula lhes é aplicada, ou como a ligação é estabelecida.

Fase 2:

Também aqui me deparei com algumas dificuldades, embora menores, uma vez que nunca me tinha preocupado com a análise de dados, quer quantitativa, quer qualitativa. Também aqui, para além do recurso específico já mencionado, foram fundamentais os documentos da autoria das docentes que me ajudarem a perceber um pouco melhor como podem analisar os dados quantitativos. Completei estas leituras com informações retiradas de Bogdan e Biklen[1] e de Afonso[2].
Deste modo, a minha resolução do problema ficou expressa no documento que entreguei em fórum e que transcrevo aqui. Novamente, trata-se de uma primeira tentativa de abordagem à análise de dados. Embora mais segura do que no problema anterior, há algumas dúvidas que se mantêm e que terão de ser esclarecidas aquando da elaboração do meu projecto de dissertação:
Análise Qualitativa de Dados
Problema 2: Retome a dissertação “Processo de Liderança e Desenvolvimento Curricular no 1º Ciclo do Ensino Básico: Estudo de Caso” e privilegie o estudo empírico realizado nesta investigação, nomeadamente, a análise de dados (pp.110-183).
Face ao corpus recolhido pela investigadora e à metodologia de análise adoptada na dissertação em análise, produza uma reflexão em torno das seguintes questões:

1) Se desenvolvesse uma investigação centrada no objecto de estudo desta dissertação, escolheria a entrevista como método de recolha de informação?

A investigação é norteada pela seguinte questão (pp.87-88):
De que modo os diferentes actores (professores, alunos, pais e coordenadora de escola) percepcionam a liderança escolar, ao nível da coordenação de escola, no processo de desenvolvimento do currículo no 1º ciclo do Ensino Básico (e os seus efeitos na cultura e no clima da escola, no comportamento e aproveitamento dos alunos e no relacionamento com as famílias e com a comunidade)?
Em função desta questão são enumerados os seguintes objectivos (p.88):
 Caracterizar o contexto escolar numa Escola do 1º ciclo do Ensino Básico nas suas diferentes dimensões (geográfica, organizativa, pedagógica…);
 Compreender o modo como os diferentes actores vêem esta escola;
 Identificar as características e estratégias de liderança e de gestão numa escola do 1º ciclo do Ensino Básico.
 Analisar o papel e a influência da(s) liderança(s) no processo de desenvolvimento do currículo a partir das percepções dos professores, alunos, pais e coordenadora de escola;
 Interpretar os efeitos e influências das lideranças na cultura e no clima da escola, no comportamento e aproveitamento dos alunos, e também nas famílias e comunidades locais.
A entrevista semi-estruturada (com guião) parece ser um instrumento adequado para a recolha de dados sobre este objecto de estudo, também pelo facto de se tratar de um estudo de caso que incide sobre uma única escola do 1º ciclo, com um número limitado de pessoas a entrevistar. Nestes moldes, a entrevista semi-estruturada:
- permite abranger todos os objectivos a que a investigadora se propôs;
- permite um entendimento mais aprofundado do objecto de estudo, uma vez que os entrevistados dão as suas opiniões, partilham as suas reflexões de forma mais livre (o que é mais difícil acontecer se tivesse de escrever); a entrevista possibilita a obtenção de uma grande riqueza de dados, fundamentais para este tipo de estudos.
A própria investigadora afirma que: ´Tendo em conta os objectivos do estudo, a utilização de um guião de entrevista (ver anexo 2) foi extremamente importante para (re)orientar e (re)encaminhar a entrevista, sempre que o entrevistado se desviava das suas questões fundamentais e para “colocar as perguntas às quais o entrevistado não chega por si próprio, no momento mais apropriado e de forma tão natural quanto possível” (Quivy et al, 1992:194).’ (p. 104).
Este comentário mostra claramente a adequação deste instrumento de recolha de dados ao objecto de estudo, para além de mostrar que a investigadora estava sensibilizada para a importância do seu próprio papel no decorrer da entrevista.
De salientar, ainda, o facto de ser fundamental a investigadora não se limitar a este instrumento de recolha de dados: Numa primeira fase procedeu à recolha e análise de documentos que permitiram caracterizar as diferentes dimensões da escola e, por conseguinte, preparar e adequar melhor o seu guião da entrevista e as suas (re)orientações e (re)encaminhamentos durante o decorrer da mesma.


Questão/Cometário: até que ponto a resposta à questão investigativa não ficou incompleta sem a inclusão do pessoal não docente? O pessoal não docente tem um papel fundamental na cultura de escola e a sua actuação depende directamente da liderança exercida pelo coordenador da escola (o facto de uma Auxiliar da Acção Educativa ter sido entrevista como Encarregada de Educação parece-me insuficiente).

2) Os procedimentos adoptados para a análise das entrevistas adequam-se aos objectivos da investigação?
Os procedimentos de análise das entrevistas adoptados parecem adequados aos objectivos que a investigadora definiu especificamente para as entrevistas (p.90 – 2º fase do quadro apresentado). Assim, a investigadora recorreu à análise de conteúdo, tentando sistematizar, organizar e sintetizar o vasto leque de informação recolhida. Sem esta sistematização dos conteúdos, seria impossível atingir os objectivos propostos, isto é, não conseguiria ‘a produção de um texto analítico sobre os dados’ (p.110).

3) Quais são as principais etapas de análise de conteúdo seguidas pela autora?
A própria investigadora, na página 113, resume desta forma os passos que seguiu na análise do conteúdo:
1º Leitura integral de cada entrevista;
2º Identificação de temas e categorias, fazendo uma análise temática, sublinhando segmentos de texto, que permitiram a selecção de unidades de significação;
3º Utilização de grelhas com os temas e categorias para a análise do corpus das entrevistas;
4º Interpretação dos dados fazendo inferências.
Importa ainda acrescentar para cada ponto:
1º - a leitura integral traduziu-se numa primeira leitura flutuante e identificação de temas pertinentes;
2º - os temas e categorias identificados estão apresentados nas páginas 113-117; a investigadora refere que seguiu uma abordagem aberta, embora tivesse, de antemão, delineado um número reduzido de categorias que lhe permitiu elaborar o guião da entrevista; as categorias são de tipo semântico e respeitam os princípios de exclusão mútua, homogeneidade, exaustividade, pertinência, produtividade e objectividade; o produto final (mas sempre sujeito a alterações) é uma grelha que serve de crivo de classificação que permite a simplificação e clarificação do material (no passo seguinte).
3º - análise foi feita em duas fases: a análise vertical (cada entrevista analisada isoladamente) e a análise horizontal (análise comparativa da entrevista); o facto de se tratar de uma entrevista semi-estruturada facilitou a análise, uma vez que o tipo de dados recolhidos é semelhante.
4º a simplificação e clarificação de dados, conseguidas através da organização e sintetização em grelhas com temas e categorias, permitiram, para além da descrição do objecto de estudo, interpretar/inferir determinados aspectos.

4) A análise de conteúdo revela-se um método adequado para o tratamento da informação recolhida?
Penso que o método se revelou adequado, uma vez que a investigadora conseguiu organizar, seleccionar e sintetizar a enorme quantidade de dados recolhidos de uma forma que lhe permitiu a produção do texto analítico sobre o objecto de estudo. Como a própria investigadora refere, o método funcionou como um crivo.

5) De acordo com as leituras que realizou, poderiam ter sido seguidas outras metodologias de análise das entrevistas?
Considero que a investigadora poderia, sobretudo, ter recorrido a um dos já numerosos programas informáticos especialmente concebidos para o tratamento de dados qualitativos. O recurso a um programa deste tipo não invalida a análise de conteúdo realizada pela investigadora. Poderia, no entanto, facilitar todo o processo.

6) Compare a sistematização da análise de conteúdo realizada pela autora com os outputs parciais publicados no espaço de documentos sobre análise qualitativa (“Análise Qualitativa. Tratamento” e Análise Qualitativa. Quadros). Que comentários lhe sugerem as diferenças que identifica?
A investigadora sistematiza os dados de uma forma descritiva e sequencial, apresenta citações que corroborem as suas afirmações – todo a sistematização parece ser feita com base na grelha de temas e categorias que foi elaborada, tendo em conta os objectivos formulados.
Os outputs parciais publicados resultam do tratamento de dados feita com recurso a programas informáticos para o tratamento de dados qualitativos, no entanto, não me é possível especificar que tipo de tratamento é feito, isto é, que aspectos são tratados e de que forma.

Fase 3 - participação no fórum geral:
Neste fórum procurei contribuir com intervenções que, para além de mostrarem que tinha identificado as ideias centrais nos documentos fornecidos e na bibliografia indicada, servissem para introduzir novas perspectivas que nos ajudassem a aprofundar as diversas linhas de discussão. Deste modo, baseei-me, em duas fontes: em Afonso (ver nota de rodapé 2 e post específico) e em Nunan
[3] (ver post específico). Penso que, desta forma, consegui enriquecer o debate e ajudar, com informações ainda não mencionadas, na construção conjunta de conhecimento.

Em síntese, foi uma actividade que, acima de tudo, serviu de alerta para a minha necessidade de, antes de elaborar o meu projecto de dissertação, aprofundar os meus conhecimentos sobre o tratamento de dados, quer qualitativos, quer quantitativos, para depois estes me permitirem optar pelas formas de tratamento de dados mais adequadas aos meus objectivos. Quanto melhor eu entender cada uma das opções, menos terei de condicionar o desenvolvimento do meu projecto.

[1] BOGDAN, R. e BIKLEN, S. (1994). Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto Editora.
[2] AFONSO, N. (2005). Investigação Naturalista em Educação. Porto: Edições ASA.
[3] NUNAN, D. (1992). Research Methods in Language Learning. Cambridge: Cambridge University Press.

Salpico de poesia

É um rio entre arvoredo
E eu durmo de o sonhar
Fazem-no de segredo
Os ramos a cruzar.

E só de o sonhar fluo...
Cerca-me outro dormir
E dentro de mim flutuo
Sem pensar nem me sentir.
(Fernando Pessoa)

Ainda a propósito do tratamento de dados...

Pareceu-me relevante também regista aqui a perspectiva de David Nunan[1] no que se refere à escolha de uma determinada técnica de tratamento de dados e aos conceitos de fiabilidade e de validade.
Assim, tirei alguns apontamentos:

Segundo Nunan, a opção por uma determinada metodologia tem mais a ver com a perspectiva filosófica do investigador sobre o mundo, do que propriamente com a oposição entre o qualitativo e o quantitativo:
‘I have argued that, while the distinction between qualitative and quantitative research is simplistic in many ways, it does represent a real, not an ostensible, distinction. However, that distinction is a philosophical one which is not always reflected in the actual conduct of empirical investigation. Underpinning quantitative research is a positivistic notion that the basic function of research is to uncover facts and truths which are independent of the researcher. Qualitative researchers question the notion of an objective reality. As Rist asserts: ‘Ultimately, the issue is not research strategies, per se. Rather, the adherence to one paradigm as opposed to another predisposes one to view the world and the events within it in profoundly different ways. (1977:43)’ (p.20)

No que se refere aos conceitos de fiabilidade (reliability) e de validade (validity), Nunan considera que são fundamentais em qualquer investigação.
Para este autor, a fiabilidade refere-se à consistência dos resultados da recolha, da análise e da interpretação dos dados. A validade refere-se ao facto se aquilo que é recolhido efectivamente é pertinente para os propósitos da investigação.
Nunan afirma que tanto a fiabilidade como a validade podem ser internas e externas:
- fiabilidade interna: consistência da recolha, análise e interpretação de dados. (pergunta chave: ‘Would an independent researcher, on reanalysing the data, come to the same conclusion?’)
- fiabilidade externa: o facto de um investigador independente conseguir reproduzir o estudo e chegar a resultados semelhantes. (pergunta chave: ‘Would an independent researcher, on replicating de study, come to the same conclusion?’)
- validade interna: o facto de a investigação poder ser interpretada (interpretability of research). (pergunta chave: ‘Is the research design such that we can confidently claim that the outcomes are a result of experimental treatment?’)
- validade externa: os resultados podem ser generalizados. (pergunta chave: ‘Is the research design such that we can generalise beyond the subjects under investigation to a wider population?’)
Nunan alerta para o facto de, por vezes, a validade interna e externa entrarem em tensão, uma vez que a tentativa de fortalecer/garantir uma delas, pode levar ao enfraquecimento da outra.

Comentário:
Mais uma vez se confirma que é necessário ler diversos autores, pois as suas perspectivas complementam o nosso conhecimento. O ponto de vista de Nunan, sem entrar propriamente em conflito com as perspectivas de Afonso (ver post específico), aborda as mesmas questões de uma maneira bastante diferente.

[1] NUNAN, D. (1992). Research Methods in Language Learning. Cambridge: Cambridge University Press.

Salpico de poesia

... e os lírios nas margens de rios remotos, frios e solenes, numa tarde eterna no fundo de continentes verdadeiros.
Sem mais nada e contudo verdadeiros.
(Bernardo Soares)

Alguns aspectos sobre o tratamento de dados qualitativos e quantitativos

Na tentativa de aprofundar os meus conhecimentos sobre o tratamento de dados na investigação educacional, estive a ler o capítulo 5, Técnicas de Análise e Interpretação de Dados, do livro Investigação Naturalista em Educação, de Natércio Afonso[1].
Aqui deixo os apontamentos que resultaram dessa leitura:

O autor começa o capítulo realçando que é do tratamento de dados que deve surgir a finalidade de todo o processo investigativo: a produção de conhecimento científico. Para reforçar esta sua ideia, cita Wolwott: o problema maior do investigador ‘não é o saber como vai recolher os dados, mas sim o de imaginar o que fazer com os dados que obteve’ (p.111). [daí a importância de conhecer bem todas as possibilidades de tratamento de dados, para que na elaboração do projecto de investigação, este aspecto ficar, logo à partida, definido em função dos objectivos formulados e para que os instrumentos de recolha de dados sejam construídos de acordo com as decisões tomadas quanto à formulação da hipótese ou questão investigativa e os respectivos procedimentos de tratamento de dados]
Afonso alerta para o facto de que o sucesso de qualquer investigação, isto é, o conhecimento científico por ela produzido, depende, em grande medida, da qualidade dos dados, entendida como a relevância que estes têm no contexto da investigação.
Assim, considera que existem três critérios de que avaliam a qualidade dos dados de uma investigação: a fidedignidade [aqui sinónimo de fiabilidade], a validade e a representatividade.
Quanto à fidedignidade, considera este autor, que ela se refere à qualidade externa dos dados (os dados referem-se a informação efectivamente recolhida e não foram fabricados).
Quanto à validade, diz Afonso, que já se refere à qualidade interna (‘a pertinência em relação ao questionamento da realidade empírica resultante do design do estudo’p.113). Isto é, o critério da validade é aquele que avalia se uma dada informação produzida é relevante para o conhecimento que se pretende produzir.
Quanto à representatividade, considera o autor, que esta é o garante de que os sujeitos envolvidos e os contextos escolhidos são representativos do conjunto dos sujeitos e contextos a que a investigação se refere. Afonso considera que este último critério é particularmente sensível na análise de dados quantitativos, quando se pretende extrapolar os resultados para um âmbito mais alargado, através de testes estatísticos.
Passando para o tratamento de dados propriamente dito, o autor considera que existem três conceitos básicos para orientar a organização e exploração de dados: a descrição, a análise e a interpretação. Estes três conceitos, com algumas adaptações, podem nortear tanto o trabalho com dados quantitativos como com qualitativos.
A descrição tenta responder à questão O que é que se passa aqui?. No entanto, ela não existe no seu estado puro, uma vez que o próprio processo de recolha de dados já implica análise e interpretação. Afonso refere que Wolcott vai mais longe e considera que os dados já são teoria.
A análise tenta responder à questão Como é que as “coisas” funcionam?. Trata-se de identificar os aspectos essenciais de uma determinada situação e descrever sistematicamente as suas relações.
A interpretação tenta responder à questão O que é que isto significa?. A informação é tratada no sentido de construir um significado. Segundo Afonso, Wolcott alerta para o facto de que é fácil levar a interpretação longe demais, isto é, de resvalar para uma ‘deriva especulativa, construindo significados e identificando implicações que os dados recolhidos não sustentam’ (p.116). Um modelo relevante que se insere neste conceito é a teoria fundamentada (grounded theory) de Strauss.
Na informação quantitativa:
A informação quantitativa é expressa em valores que resultam de um processo de medição de variáveis, através do qual se atribuíram números com base em regras preestabelecidas. Estas medidas das variáveis são classificadas numa de quatro possíveis escalas: nominal (classificação da variável em diferentes categorias), ordinal (as variáveis são diferenciadas e ordenadas em função de uma dada dimensão), intervalar (a magnitude dos intervalos entre os números que representam as diferenças na variável que está a ser medida é igual), razão (tem as mesmas características da escala intervalar, no entanto, o valor zero é real, isto é, corresponde à ausência da variável).
A descrição e análise das medidas, obtidas com qualquer uma destas escalas, são realizadas através de um conjunto de procedimentos – a estatística.
A estatística descritiva descreve, através da obtenção de um número, um conjunto de características medidas numa amostra.
A inferência estatística é um processo de tirar conclusões sobre valores desconhecidos, a partir de estatísticas obtidas de medidas efectuadas numa amostra.
Os testes de hipóteses estatísticas servem para determinar se as diferenças observadas entre dois grupos relativamente a uma variável são atribuíveis a uma variável independente ou se surgiram do acaso.
As estatísticas de correlação determinam se dois conjuntos de valores estão relacionados.
As estatísticas de regressão tentam estabelecer um conjunto de valores a partir de um outro conjunto de valores.
(‘No processamento de dados quantitativos através da organização de material estatístico descritivo e da realização de testes para verificação das hipóteses de pesquisa, o dispositivo de análise e interpretação está claramente formatado e desenvolve-se numa sequência linear, a partir da recolha efectuada. (p.118).)
Na informação qualitativa:
O tratamento deste tipo de informação é mais ambíguo, moroso e reflexivo, concretizando-se numa lógica de crescimento e de aperfeiçoamento. Assim sendo, não há a formatação do dispositivo prévia ao tratamento de dados. O dispositivo de tratamento é construído e consolidado à medida que os dados são organizados e trabalhados.
O investigador deve explorar e mapear o seu material, tendo em mente os seus objectivos de pesquisa, ‘mobilizando e testando estratégias produtoras de significados relevantes, transformando progressivamente os dados em elementos constitutivos de um novo texto (o texto científico)’ (p.118). O texto científico é, por conseguinte, uma leitura que resulta do contacto entre o contexto específico e o olhar, igualmente específico, do investigador.
Assim, a descrição será o primeiro patamar do processo interpretativo, tratando-se de utilizar as palavras para produzir uma imagem mental de um determinado aspecto, a partir do ponto de vista do autor.
A análise, ou como Anselm, Strauss e Corbin lhe chamam, a estruturação conceptual encontra-se no patamar intermédio da construção interpretativa. Trata-se da organização dos dados em categorias, dando profundidade analítica ao texto descritivo.
A interpretação, ou como Anselm, Strauss e Corbin lhe chamam, a teorização traduz-se num ‘conjunto de categorias bem desenvolvidas (temas, conceitos) que são interligados sistematicamente por intermédio de proposições que estabelecem esse relacionamento, de forma a constituir uma estrutura integrada que pode ser usada para explicar e prever um fenómeno social’ (p.119).
Afonso refere seis fases nos procedimentos analíticos do material (baseado em Marshall e Rossman): a organização dos dados; a produção de categorias, temas e padrões; a codificação dos dados; a testagem das interpretação que vão surgindo; a busca de explicações alternativas; a produção do texto final.

Comentário:
Este capítulo parece-me particularmente interessante por abordar, de forma muito clara, a questão da fiabilidade e da validade. Também me parece esclarecedora a ideia de que qualquer tratamento de dados (quantitativo ou qualitativo) tem por base um destes três conceitos base – descrição, análise e interpretação.
Só há um aspecto que me deixa algumas dúvidas: o autor afirma que no tratamento de dados quantitativos, todo o processo é linear e pode ser definido antes mesmo de procedermos à recolha de dados. No tratamento de dados qualitativos, afirma que o processo está sempre em construção, sofrendo alterações conforme os dados forem tratados.
A minha dúvida é a seguinte: será que o processo de tratamento de dados quantitativos é, de facto, assim tão rígido? Se o investigador detectar que, a partir dos dados recolhidos, ainda pode aplicar técnicas anteriormente não previstas e que estas poderão reforçar a construção do conhecimento científico, estas não poderão ser aplicadas, sob pena de invalidar o estudo?
Por outro lado, não terá já o investigador de pensar, aquando da construção dos instrumentos de recolha de dados, na forma como os pretende tratar? Não terá de ter à partida algum dispositivo de tratamento de dados pensado?
Fiquei a pensar o seguinte: embora na investigação qualitativa a dinâmica na construção do dispositivo de dados seja mais significativa, para se poder adaptar ao tipo de dados que são recolhidos e cujo surgimento o investigador não podia prever, também terá de haver essa possibilidade na investigação quantitativa (p. ex. e se surgir uma variável (do tipo extraneous ou confounding) que não estava prevista? O investigador terá de ter isso em conta no processo de tratamento de dados que, inevitavelmente, irá sofrer alterações. ???).
Portanto, considero que tanto no tratamento de dados (quantitativos e/ou qualitativos), tem de haver uma planificação prévia do dispositivo de tratamento, sendo que, no caso de dados qualitativos, isso terá de ser feito numa perspectiva mais dinâmica, aberta a adaptações e alterações.



[1] AFONSO, N. (2005). Investigação Naturalista em Educação. Porto: Edições ASA.

Salpico de poesia

Trago dentro de mim um mar imenso
feito de vagas tristes
e sonhos vagos

o horizonte é uma manhã
que eu quis minha para ser eu

e para porto de abrigo escolhi uma tarde
que soubesse chorar a morte do sol
(José Rui Teixeira)

Reflexão sobre o decurso da actividade 4, ‘Natureza da investigação-acção’, inserida na temática 3, ‘A investigação-acção’

Esta actividade centrou-se no método de investigação denominado de ‘investigaçã-acção’, que se desenvolveu em torno da ideia de que, por um lado, se deve investigar a acção e, pelo outro, a acção para melhorar tem de ser o resultado de uma investigação. Daí que surja o modelo em espiral que pretende visualizar o desenvolvimento deste método de investigação.
Regressámos com este tema, à figura do professor-investigador que já tínhamos abordado na actividade um e que, nessa altura, tinha sido objecto do meu estudo mais aprofundado através de um artigo de Hammersley (ver posts ‘A figura do professor-investigador’ e ‘Ainda a propósito do professor-investigador). Também reencontramos nomes como Stenhouse e Kemmis, ambos citados no referido artigo.
Participação no fórum geral:

Esta actividade foi desenvolvida em regime individual, assente na análise da bibliografia disponibilizada pelas docentes e em outras pesquisas efectuadas.
Foi aberto um fórum informal para troca de ideias. Aí foram colocadas as ideias gerais constantes da bibliografia facultada. Mas, na sua maioria, as diferentes intervenções enriqueceram o debate com ideias resultantes de outras fontes.
Também eu tentei participar com novas perspectivas e ideias, tendo por base um artigo de Kemmis, que alguns/algumas colegas já tinham mencionado. Como encontrei um artigo do próprio autor, decidi analisá-lo e partilhar com os meus colegas, de forma sucinta, as principais ideias nele contido (ver o post ‘Uma perspectiva sobre a investigação-acção’).
Penso que, deste modo, consegui contribuir para a identificação dos aspectos centrais do tema e aprofundar as diversas linhas de debate com novas perspectivas ou reforçando ideias anteriormente avançadas pelos colegas. Tudo isso, baseado em documentação, fruto de pesquisa pessoal.


Em síntese, foi uma actividade que me permitiu aprofundar um método de investigação que já no decorrer da actividade 1 me tinha deixado curiosa – principalmente, após análise do artigo crítico de Hammersley relativamente à figura do professor-investigador. Há portanto divergências quanto à importância do papel da investigação-acção na investigação educacional.

Salpico de poesia

Poema mestiço

escrevo mediterrâneo
na serena voz do Índico

sangro norte
em coração do sul

na praia do oriente
sou areia náufraga
de nenhum mundo

hei-de
começar mais tarde

por ora sou a pegada
do passo por acontecer
(Mia Couto)

Uma perspectiva sobre a Investigação-Acção

Nas minhas pesquisas para entender um pouco melhor a IA, encontrei um artigo de Kemmis com o título ‘Action Research’[1].
Aqui ficam os meus apontamentos:

Kemmis apresenta a seguinte definição de IA:
‘Action research is a form of self-reflective enquiry undertaken by participants in social (including educational) situations in order to improve the rationality and justice of (a) their own social or educational practises, (b) their understanding of these practices, and (c) the situations in which the practises are carried out. It is most rationally empowering when undertaken by participants collaboratively, though it is often undertaken by individuals, and sometimes in cooperation with ‘outsiders’. In education, action research has been employed in school-based curriculum development, professional development, school improvement programmes, and systems planning and policy development. Although these activities are frequently carried out using approaches, methods, and techniques unrelated to those of action research, participants in these development processes are increasingly choosing action research as a way of participating in decision making about development.
In terms of method, a self-reflective spiral o cycles of planning, acting, observing, and reflecting is central to the action research approach.’ (pp.177-178).
[atenção ao vasto leque de áreas que o autor enumera, em que a IA foi e é, cada vez mais, aplicada de modo a melhorar a prática]
Realça também o facto de que a IA, realizada em trabalho colaborativo, consegue obter resultados mais profundos, o que nos remete para o trabalho em equipas de investigação - novamente a ideia de que o investigador não pode estar isolado.
Kemmis foca, igualmente, o método da espiral em ciclos de planeamento, acção, observação e reflexão. [com base em Kurt Lewin, ‘pai’ da IA]

Baseando-se em Carr e Kemmis, o autor afirma que a IA é uma das formas de investigação mais adequadas para a investigação em educação, porque contempla todos os pressupostos que considera fundamental:
'1- it must reject positivist notions of rationality, objectivity, and truth;
2- it must employ the interpretive categories of teachers (or the other participants directly concerned with the practices under inquiry);
3- it must provide ways of distinguishing ideas and interpretations which are systematically distorted by ideology from those which are not, and provide a view of how distorted self-understandigs can be overcome;
4- it must be concerned to identify and expose those aspects of the existing social order which frustrate rational change, and must be able to offer theoretical accounts which enable teachers (and other participants) to become aware of how they may be overcome;
5- it must be based on an explicit recognition that it is practical, in the sense that the question of its truth will be determined by the way it relates to practise.' (pp. 179-180)
[estamos perante uma perspectiva em tudo diferente da de Hammersley, analisada num post sobre a figura do professor-investigador!!!]

Duas ideias centrais sobre o ‘objecto’ da IA em educação:
- o ‘objecto’ são as práticas educativas (praxis), isto é, são as estratégias que são implementadas em resposta a um determinado contexto;
- a IA, sendo um estudo da praxis, tem de se traduzir na investigação da nossa própria praxis – isto é, só o ‘praticante’ pode investigar plenamente a sua praxis (voltamos à ideia do ‘teacher as researcher’).

Comentário:
Este artigo tem interesse por nos transmitir a perspectiva de um acérrimo defensor da IA e, ligada a esta, da figura do professor-investigador.
O artigo ganha particular relevo quando confrontado com as perspectivas de Hammersley, que não defende a IA e a figura do professor-investigador como o método de investigação/investigador mais adequado para a investigação educacional – antes considera que são mais um método e mais um tipo de investigador, com pontos fortes e fracos que convém ter presentes!



[1] KEMMIS, S. (1993). Action Research. In Hammersley, M. (edt.). Educational Research – current issues (pp.177-190). London: Paul Chapman Publishing.

Salpico de poesia

Mar

Não te espantes com máquinas,
Com invenções de última hora.
Inacreditável é a quantidade de elementos
Que ainda não obedecem aos homens.
(Gonçalo M. Tavares)

Reflexão sobre o decurso da actividade 3, ‘Utilizar e preparar entrevistas’, inserida na temática 2, ‘O processo de recolha de dados’

Esta actividade centrava-se sobre a utilização da entrevista na investigação.
Trata-se de um instrumento de recolha de dados muito comum e relevante na investigação educacional. A entrevista é um instrumento ‘adaptável’ às mais diversas situações (individual, em grupo, presencial, via telefone, email,...) e necessidades (pode ser curta, longa, ter uma sessão ou mais, falar de um só tópico, abarcar um grande número de tópicos...). Assim, é natural que tenhamos diversos tipos de entrevistas, entre os quais se destacam a entrevista estruturada (com um guião de perguntas fixo, que é seguido pelo entrevistador naquela sequência e sem omitir ou acrescentar perguntas – tanto pode ter questões fechadas – geralmente, em estudos quantitativos - ou abertas – geralmente, em estudos qualitativos), a semi-estruturada (com um guião de perguntas, cuja ordem pode ser alterada, em que podem ser acrescentadas ou omitidas perguntas, conforme do decorrer da entrevista – utilizada em estudos qualitativos) e a entrevista aberta (sem estrutura fixa, geralmente sem guião – em estudos qualitativos).
Deste modo, entende-se que, quanto mais aberta a entrevista for, mais a sua qualidade depende do entrevistador. Daí que tenha decidido, no trabalho em equipa (azul), destacar o papel do entrevistador da seguinte forma:
‘A qualidade da entrevista está indissociavelmente ligada ao entrevistador. E essa relação torna-se mais evidente quanto menos estruturada for a entrevista.
Na entrevista estruturada (geralmente associada à investigação quantitativa), o entrevistador tem de cumprir alguns princípios básicos: ser educado, explicar o objectivo da entrevista, garantir a confidencialidade, seguir a sequência de perguntas que consta do seu guião, registar as respostas que lhe são dadas (geralmente, resposta muito curtas ou, até, cruzes ou indicações de sim e não), abster-se de fazer comentários.
Quanto mais aberta for a entrevista, mais complexa e multifacetada se torna o papel do entrevistador, isto é, mais a qualidade de entrevista pode depender das características e competências do entrevistador.
É importante que o entrevistador consiga estabelecer uma relação de confiança com o entrevistado – isto implica, que o entrevistado não tenha nunca a sensação de vai ser, de alguma forma, avaliado ou julgado.
Deve formular as suas intervenções, (quer se trate de perguntas directas ou formas de incentivar o entrevistado a aprofundar ou esclarecer um aspecto) de forma clara e inequívoca para não amedrontar o entrevistado.
Deve saber ouvir: deve estar atento ao que o entrevistado diz e como o diz.
Deve ter sensibilidade para entender meias palavras ou se algo não foi dito – e saber se se trata de uma situação em que é sensato, para o desenvolvimento da entrevista, indagar e aprofundar mais.
Deve ser flexível – ele deve ser capaz de responder imediatamente às situações com que se depara: a entrevista é um encontro entre dois (ou mais) seres humanos, tratando-se, portanto, de uma interacção única.
Deve ter sensibilidade para gerir e reconhecer os silêncios – os silêncios podem surgir por diversos motivos e as reacções a eles devem ser ajustadas.
Deve ser capaz de levar o entrevistado, caso interesse para a investigação, a aprofundar mais um determinado aspecto, sem, no entanto, o influenciar ou deixar transparecer as suas próprias crenças e opiniões.
Como um detective (Bogdan & Biklen, 1994, p. 139), deve se paciente e conseguir decidir o que é relevante ou não e conseguir ligar as informações que vai obtendo do entrevistado.’ (lançado em fórum, no espaço de trabalho da equipa azul, a 29 de Abril (21:42))
Trabalho em grupo (equipa azul):
Também nesta actividade tentámos construir o nosso conhecimento acerca deste instrumento de recolha de dados à luz das questões colocadas pelas docentes da unidade curricular e tendo em conta a análise da dissertação com as respectivas questões. Assim, participámos nos diferentes temas, no sentido de esclarecer dúvidas e debater opiniões. A fonte principal para o desenvolvimento desta actividade foi o documento fornecido pelas docentes, Interviewing in qualitative research (consulta do original no espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’) e Bogdan e Biklen
[1], que consta da bibliografia fundamental desta Unidade Curricular. No entanto, todos nós conseguimos contribuir para a discussão com novas fontes que mereceram a nossa análise e que ajudaram a aprofundar os nossos conhecimentos.
Todos participámos activamente na elaboração da matriz exemplificativa do guião de uma entrevista semi-estruturada.
De realçar que a relevância e a sequência de algumas etapas foram objecto de discussões demoradas e profundas, em que houve um esgrimir de argumentos até chegarmos ao consenso final. Talvez por isso mesmo, tratou-se de uma fase de trabalho muito enriquecedora.
A avaliação que a equipa fez da participação de cada um dos seus elementos é reflexo de toda esta agitação fomentadora da aprendizagem.
Participação no fórum geral:
Ao contrário do que aconteceu no trabalho em equipa (equipa azul, entenda-se), o trabalho conjunto em fórum não correu muito bem – talvez pelo entendimento divergente da ideia de matriz exemplificadora, patente nos trabalhos que surgiram nos vários grupos.
Facto é que não se conseguiu chegar, em tempo útil, a um consenso que permitisse a conclusão, com sucesso, desta actividade.

Em síntese, foi uma actividade que incidiu num instrumento de recolha de dados que eu considero muito interessante e útil. Principalmente, durante a fase de trabalho de grupo, consegui aprofundar aspectos que me parecem muito relevantes, como, por exemplo, as diferentes tipologias de entrevistas e o papel do entrevistador.


[1] BOGDAN, R. e BIKLEN, S. (1994). Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto Editora.

domingo, 29 de junho de 2008

Salpico de poesia

Mar Sonoro


Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim.
A tua beleza aumenta quando estamos sós
E tão fundo intimamente a tua voz
Segue o mais secreto bailar do meu sonho.
Que momentos há em que suponho
Seres um milagre criado só para mim.
(Sophia de Mello Breyner Andresen)

Reflexão sobre o decurso da actividade 2, ‘Utilizar e preparar questionários’, inserida na temática 2, ‘O processo de recolha de dados’

Esta actividade centrava-se sobre a utilização do questionário na investigação. Trata-se de um instrumento de recolha de dados que é muito utilizado na investigação quantitativa, embora também seja considerado útil em investigações que adoptem uma metodologia mista. O objectivo dos questionários é a obtenção de informação sobre determinados aspectos de uma determinada população e, eventualmente, a relação entre esses mesmos aspectos. Para que cumpra o seu fim, tem de ser elaborado de forma rigoroso para que i) se obtenha, de facto, a informação de que se precisa para o estudo; ii) a informação recolhida possa ser analisada e tratada da forma pretendida. Ambos os fins podem ser assegurados através de uma pré-testagem do questionário.
Este instrumento pode ser utilizado em diversos tipos de estudo, como, por exemplo, estudos confirmatórios (para confirmação, ou não, de hipóteses), estudos exploratórios e descritivos (onde não se parte de hipóteses, mas sim de questões investigativas).
Na bibliografia consultada – Educational Research (ver resumo e espaço ‘Gogos, conchas e pérolas), Guide to the design of questionnaires (ver espaço ‘Gogos, conchas e pérolas) e Hill e Hill
[1] foi possível detectar princípios para a construção de um questionário, para além das suas vantagens e desvantagens.
Trabalho em grupo (equipa azul):
Tentámos construir o nosso conhecimento acerca deste instrumento de recolha de dados à luz das questões colocadas pelas docentes da unidade curricular. Assim, todos participamos nos diferentes temas, no sentido de partilhar os resultados das nossas pesquisas, de esclarecer dúvidas e debater opiniões.
Todos participámos activamente na elaboração do esquema gráfico sobre o planeamento de um questionário. A avaliação que a equipa fez da participação de cada um dos seus elementos é reflexo disso.
O nosso esquema e trabalho finais partiram sempre da necessidade da hipótese, facto que só na fase de discussão em grande grupo se revelou como sendo redutor, uma vez que o questionário também pode ser utilizado em outros tipos de estudos. (Fruto da sobrevalorização de algumas fontes? – novamente a importância da consulta de diversas fontes!)
No entanto, penso que esta fase serviu para analisar, de forma aprofundada, os aspectos a serem tidos em conta aquando da elaboração de um questionário – que, afinal, é muito mais complexo do que eu alguma vez tinha suposto.
Participação no fórum geral:
Foi nos dois temas de discussão, ‘Hipóteses – sempre?’ e ‘Proposta de um exercício de validade’ que alguns aspectos muito interessantes foram aprofundados. Desde logo, a facto de um questionário não servir exclusivamente para recolher dados que permitam confirmar ou rejeitar uma hipótese (como, aliás, já disse anteriormente).
Abordámos a diferença entre a hipótese e a questão investigativa e o que uma e outra implicam em termos de desenvolvimentos dos estudos e, consequentemente, dos questionários.
Debatemos a validade científica da abordagem qualitativa, com argumentos, que em parte resultaram da consulta de Bogdan e Biklen
[2].
Curiosamente, foi nesta segunda parte que a análise do questionário da dissertação, que tinha sido trabalhada na primeira fase desta actividade, ganhou maior importância, uma vez que serviu para mostrar que a elaboração de um questionário não tem de partir de uma hipótese. Além disso, conforme fui aprofundando os meus conhecimentos, comecei a perceber melhor o raciocínio que norteou a investigadora na elaboração do questionário – ao ponto de considerar que, para ser possível responder a algumas das questões investigativas, alguns dos itens do questionário teriam de ser reformulados e seria necessário acrescentar mais algumas questões para obter dados que permitissem um estudo realmente rigoroso.
Penso que nas minhas intervenções consegui mostrar que identifiquei as ideias centrais sobre este instrumento de recolha de dados. Tentei aprofundar alguns aspectos, recorrendo, através de citações, aos recursos bibliográficos e à dissertação que serviu de base a esta actividade. Comentei o ponto de vista dos colegas, no sentido de reforçar algumas ideias e procurei centrar-me nas temáticas que sucessivamente foram propostas pela docente.

Em síntese, foi uma actividade que incidiu num instrumento de recolha de dados que me surpreendeu pela complexidade que sua construção cuidada implica.



[1] HILL, M. e Hill, A. (2005). Investigação por Questionário. Lisboa: Edições Sílabo.
[2] BOGDAN, R. e BIKLEN, S. (1994). Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto Editora.

Salpico de poesia

Tarde de praia, ao longe

Lentamente construo estes murmúrios,
nesta palavra mar já tão profunda.

Solto o vento de rodas as viagens,
nestas praias de gente sem fronteiras.

Pequenas multidões pulsam a vida
e o mar apenas sobe mais azul.

Minucioso, espalho o meu olhar,
pelo secreto adeus do horizonte.

No som tão repetido dos navios,
há muito se esgotaram as sereias.

Desce a preguiça pela tarde lenta,
nas horas o silêncio vem de longe.
(Rui Namorado)

Reflexão sobre o decurso da actividade 1, ‘Planear uma investigação’, inserida na temática 1, ‘O processo de investigação’

Tenho de confessar que o ‘arranque’ desta Unidade Curricular me foi particularmente difícil, como, aliás, já mencionei na nota de abertura deste webfólio.
Fase inicial, individual:
Com a abertura da temática 1, tentei ficar com um conhecimento geral dos conteúdos a serem desenvolvidos ao longo de toda a Unidade Curricular. Li, muito atentamente, todos os capítulos de Educational Reseach (o resumo encontra-se nesta sequência de posts e o documento original pode ser consultado no espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’), cujas informações mais relevantes tentei resumir. Deste modo, fiquei com um conhecimento base que me permitiu começar a entrar no mundo da Investigação Educacional.
E foi com base neste conhecimento que tentei analisar a dissertação indicada pelas docentes (ver post ‘O meu primeiro contacto...’), tentando responder às questões colocadas.
Trabalho em grupo (grupo azul):
A elaboração, em grupo, de um guião relativo às etapas de um projecto de investigação foi muito interessante, por diversas razões:
1- as análises feitas à dissertação eram semelhantes (o que me deu alguma segurança no prosseguimento do trabalho);
2- todos contribuímos, através, das nossas pesquisas individuais, com propostas para um alinhamento das etapas do projecto de investigação;
3- todas essas propostas tinham ligeiras diferenças, embora, em geral, as etapas fossem semelhantes. Surgiram propostas baseadas em diversas fontes: Educational Research, Derek Swetman (citado por Carlos Ceia – ver espaço ‘Gogos, conchas e pérolas’), Quivy e Campenhoudt, Cohen, Manion e Morrison e Carmo e Ferreira. Este aspecto parece-me particularmente interessante, pois, para além de nos mostrar que não há uma regra fixa, alertou-nos igualmente para a importância de cada etapa no desenvolvimento de um projecto de investigação;
4- o resultado do nosso trabalho, isto é, o texto e o guião, surgiu da colaboração de todos e, sem excepção, ficámos satisfeitos com o produto final do nosso trabalho.
Penso que a avaliação feita em equipa, sobre cada um dos seus elementos, reflecte esse envolvimento e a satisfação com que todos trabalhámos.
Participação do fórum geral:
Aqui deparei-me com uma grande dificuldade – a sucessão de mensagens colocadas pelos colegas foi muito rápida e, por vezes, as discussões centraram-se em aspectos sobre os quais não me sentia suficientemente segura para intervir. Aprendi muito ao ler os posts dos meus colegas, que se centraram em torno de três grandes pontos de discussão:
1- a diferença entre paradigma e metodologia (que consegui aprofundar, também, através de outras Unidades Curriculares);
2- a existência ou não de um paradigma mix (junção do quantitativo e do qualitativo);
3- a diferença entre a investigação indutiva e a investigação dedutiva – aí houve uma intervenção de um(a) colega que foi particularmente feliz ao nos recordar a imagem da roda da investigação;
Quanto ao fórum dedicado à importância das etapas, penso que se trata de uma questão que dá pouco ‘espaço de debate’ e que, com a intervenção de um ou dois colegas, ficou esgotada, uma vez que os posts foram bastante completos (não me parece útil, nem sensato a um espaço de discussão repetir o que já foi dito ou dizê-lo novamente com outras palavras).
Participação nos fóruns dos diferentes trabalhos de grupo:
Li todos os trabalhos atentamente. Gostei do facto dos diferentes grupos terem feito abordagens diferentes ao mesmo tema. Assim, houve grupos que elaboraram um guião das etapas do projecto de investigação, enquanto um outro se debruçou mais sobre a elaboração de um guião para o documento final propriamente dito. Penso, que estas diferentes abordagens acabam por completar e enriquecer o conhecimento que vamos construindo sobre cada um dos temas – pois, como sabemos, dentro de cada grupo são desenvolvidos percursos e raciocínios próprios que, consequentemente, deixam de lado outros possíveis caminhos.
Procurei uma particularidade em cada trabalho de grupo que me parecesse interessante e, por isso, merecedora de destaque e de maior aprofundamento em momentos de estudo posteriores. Assim, os trabalhos das outras equipas motivaram-me a procurar e conhecer melhor a história da investigação educacional e a especificidade do estudo de caso. Tentei, de forma muito sucinta, reforçar esses aspectos nos meus comentários sobre os diversos trabalhos.
Quanto ao fórum de discussão relativo ao nosso trabalho, procurei acompanhar e participar no debate interessante que se desenvolveu em torno da figura do professor-investigador vs o investigador-investigador (profissional). Também esta discussão me levou a procurar mais informação, que tentei partilhar nas minhas intervenções.

Em síntese, foi uma actividade muito trabalhosa, mas que proporcionou uma aprendizagem significativa.

Salpico de poesia

Gota de Água

Eu, quando choro,
não choro eu.
Chora aquilo que nos homens
em todo tempo sofreu.
As lágrimas são as minhas
mas o choro não é meu.
(António Gedeão)

O meu primeiro contacto com uma dissertação, analisando-a como tal

Considero um marco importante, neste meu processo de aprendizagem no mundo da Investigação Educacional, a leitura e análise que fiz da dissertação indicada pelas docentes desta Unidade Curricular: As TIC no JI: contributos do Blogue para a Emergência da Leitura e da Escrita, de Ádila Ferreira Lopes.
Por ter sido para mim um momento significativo, como um despertar (Atenção, é algo como isto que se espera que tu consigas fazer daqui a uns meses!) para o trabalho que aí se aproxima, parece-me justificada a inclusão, neste meu webfólio, do documento de análise que elaborei a partir das questões lançadas pelas docentes:


Análise da dissertação As TIC no JI: contributos do Blogue para a Emergência da Leitura e da Escrita, de Ádila Ferreira Lopes

1- A autora apresenta claramente o problema formulado na investigação?
Na página 7 da dissertação pode ler-se: ‘Propomo-nos estudar os contributos das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), mais concretamente averiguar de que forma o blogue contribui para a emergência da leitura e da escrita em contexto pré-escolar.’
Também na página 8, a investigadora apresenta o problema com a seguinte formulação: ‘Este estudo pretende averiguar de que forma o uso do blogue em contexto educativo constitui uma ferramenta promotora de literacia.’
Portanto, o problema parece-me claro. No entanto, depois, são enumerados, ainda na página 8, cinco objectivos que parecem ir, em parte, além do problema formulado:
- Analisar a contribuição dos blogue para a emergência da leitura e da escrita
- Compreender o modo como se processa a emergência da leitura e da escrita através dos suportes informáticos
- Reflectir sobre a contribuição dos projectos integradores e promotores de leitura e escrita, em suporte digital (pode-se generalizar assim a partir de um estudo e a base teórica apresentada?)
- Compreender de que forma o blogue influencia o processo da aprendizagem da leitura e da escrita
- Encontrar respostas para as dúvidas dos educadores de infância quanto ao uso das tecnologias de informação e comunicação no jardim-de-infância (muito abrangente?)

2- É apresentada uma revisão bibliográfica?

Na página 11, a investigadora apresenta os estudos já existentes na área, que considera serem poucos (uma limitação ao seu estudo): ‘Por outro lado, investigámos numa área educacional em que existem poucos estudos: no panorama nacional apenas encontrámos os de Lúcia Amante (2004), com uma investigação sobre a integração das novas tecnologias em contexto de Educação Pré-Escolar, com recurso ao computador na actividade de escrita; Maria Cruz (2004) com uma investigação sobre a integração da world wide web nas actividades do jardim-de-infância, numa análise sobre o envolvimento das crianças de 5 anos; e finalmente a investigação de Alexandra Paz (2004), sobre software educativo múltimédia no jardim-de-infância, centrando-se nas actividades preferidas pelas crianças dos 3 aos 5 anos de idade.’
Mais tarde, na página 47, a investigadora refere-se a outros estudos que terão sido feitos relativamente à utilização dos blogues em contexto educativo (não limitado ao JI): A este propósito, salientamos alguns estudos realizados no panorama nacional, reveladores do interesse por parte da comunidade científica: os de Ana Amélia Carvalho, Sónia Cruz, Adelina Moura, (2006); Maria João Gomes, (2005), entre outros.

3- Há elementos relativos à planificação da investigação?
A investigadora limita-se a apresentar, na página 52, uma calendarização daquilo que considera serem os dois momentos do estudo: O estudo obedeceu a uma calendarização previamente definida e que, em linhas gerais, teve os seguintes momentos:
1º Momento – construção do blogue disponível em
http://dajaneladomeujardim.blog.com/ (Outubro, 2006);
2º Momento – trabalho de campo no jardim-de-infância (Dezembro a
Maio de 2007).

4- Quais são os elementos referenciados sobre o estudo empírico
[1]?
A investigadora afirma tratar-se de um estudo de caso
[2], inscrevendo-se, portanto, no paradigma qualitativo.
Define, na página 51, o problema, o contexto e o objecto: ‘depois de identificada a problemática a estudar – as TIC no jardim-de-infância: contributos do blogue para a emergência da leitura e escrita – e encontrado um contexto – jardim-de-infância de Rio Covo St.ª Eulália – e um objecto de estudo – Sala 1’
Tratando-se, portanto, de um estudo de caso é importante a afirmação da investigadora (p.51): ‘parece-nos que mais do que quantificar ou generalizar, interessa-nos compreender um processo’
Também está de acordo com o paradigma de investigação escolhido o facto de:
‘observar e questionar os sujeitos – crianças’ e de que ‘a recolha de dados foi feita no ambiente natural – sala sendo a Educadora/investigadora observadora participante’ (p.51)

5- São identificados os instrumentos de recolha de informação?
É sobretudo nas páginas 51 e 559-61 que a investigadora se refere à recolha de informação:
‘A observação participante no contexto natural de acção, consubstanciada
no diário de pesquisa, constituiu a principal forma de recolha de dados, a que se juntam informações provenientes de outras fontes,’ (p. 51)
‘outras técnicas de recolha de dados que se afiguraram relevantes,
entre elas os registos diários do trabalho das crianças, os registos de vídeo, e as entrevistas às crianças a partir das quais descobrimos a sua perspectiva sobre as experiências de aprendizagem que realizaram.’ (p. 51)
‘Para o desenvolvimento deste trabalho, optámos pelas seguintes técnicas de recolha de dados: observação participante, notas de campo, entrevistas informais e entradas no blogue. A principal técnica de recolha de dados foi a observação participante.’ (p. 59 – até à página 61 caracteriza cada uma das ‘técnicas’)
Parece-me haver aqui alguma indiferenciação de conceitos:
- a observação participante
[3] é uma forma de observação, refere-se à atitude que o observador assume face ao seu objecto de estudo[4];
- não deve, portanto, ser confundida com as técnicas e os instrumentos de recolha de informação que também são mencionados (entrevistas informais, notas de campo, etc.)

6- Quais os procedimentos de análise de dados?
A dissertação tem um capítulo inteiro dedicado à análise de dados, dividido em vários sub-capítulos. Nestes, a investigadora tenta cumprir alguns dos objectivos inicialmente propostos, servindo-se do relato de algumas etapas do projecto.
No entanto, o modo de análise não está explicitado.

7- É possível identificar as conclusões da investigação?
Existe um capítulo específico para as conclusões.
Na página 84, a investigadora afirma ‘este estudo pretendeu ir de encontro às investigações que defendem a familiarização da criança em idade pré-escolar com as TIC’ e apresenta algumas conclusões nesse sentido.
No fundo, a investigadora analisou um projecto, tentando, através dele verificar se os estudos existentes nessa área seriam confirmados.

8- Qual o paradigma em que se insere a investigação?
Trata-se do paradigma qualitativo, isto é, do Método de Investigação Qualitativa
[5], do tipo estudo de caso.

[1] Estudo empírico = investigação baseada na recolha de dados observáveis (Educational Research - ver espaço 'Gogos, conchas e pérolas')
[2] Estudo de caso = pretende fornecer relato/estudo/análise detalhado/a de um ou mais casos (Educational Research)
[3] Albano Estrela (1994:31) define a observação participante de seguinte maneira: ‘Fala-se de observação participante quando, de algum modo, o observador participa na vida do grupo por ele estudado’ (ESTRELA, A. (1994).Teoria e Prática de Observação de Classes. Porto: Porto Editora)
[4] Albano Estrela (1994:30)
[5] (Educational Research - ver espaço 'Gogos, conchas e pérolas)

Salpico de poesia

Choveu de madrugada...
E agora as raízes mergulham mais na terra
as bocas que comem.

Que bom! Cheira a terra molhada.
Cheira à criação do primeiro homem.
(José Gomes Ferreira)

Ainda a propósito do professor-investigador...


No artigo de Hammersley foram abordadas, entre outros, algumas características da figura do professor-investigador, suas vantagens e desvantagens na investigação educacional.
É curioso verificar como no nosso debate alguns dos aspectos desenvolvidos por Hammersley surgiram. Transcrevo uma resposta minha a um(a) colega de mestrado, precisamente no contexto de discussão sobre o professor-investigador. Repare-se como muitos dos argumentos analisados por Hammersley estão presentes:
Olá _______,
entendo as tuas dúvidas. Mas aí voltamos ao ponto que já debatemos inúmeras vezes neste mestrado - tem de haver uma mudança de mentalidade nas nossas escolas para que se possa criar uma cultura de escola. Eu sei que é difícil, que estamos 'atulhados' de tarefas que não deveriam ser as nossas, que nos exigem coisas sem nos darem condições para isso,...
No entanto, parece-me também muito grave que estejamos à espera que as coisas nos caiam do céu, sem que tenhamos de fazer um esforço para as conseguir.
O que quero dizer, é que há as duas vertentes: por um lado, não temos condições, por outro, não fazemos nada ou muito pouco para efectivamente mudar algo.
Já discutimos neste mestrado que a mudança de mentalidade demora muito tempo - também já vimos que ela nunca acontecerá se não houver vontade para que ela aconteça (e todos aqui nos temos queixado das barreira que encontramos por todo o lado, por parte dos nossos colegas nas escolas).
Portanto, às tuas perguntas vou responder com perguntas ('tipo advogado do diabo';-)):
'Desconhecerem os trabalhos desenvolvidos?' - O que os impede de procurarem por esses trabalhos? Quantos colegas nossos é que tu conheces que procuram ler livros sobre educação (a maioria mal lê seja o que for!)? Que esforços é que tu vês nas escolas para colmatar essa falha?
'Ainda não se encontram organizados de forma a trabalharem em equipa?' - E tem de vir alguém de fora organizá-los? Então, queremos autonomia e não nos conseguimos organizar para trabalhar em equipa?
'A formação que têm (acções de formação)...não lhes faculta esse tipo de trabalho...?' - E porque é que na elaboração do PE, em que deve estar definido a necessidade de formação que a escola sente, não se procura organizar esse tipo de acções? Será que quando os CFAE, uma vez por ano, pedem às escolas para lhes transmitir as suas necessidades de formação, recebem sugestões nesse sentido? Será que a maioria dos professores entende as acções de formação como uma oportunidade de desenvolvimento e crescimento profissionais? Ou será um conjunto de horas que têm de cumprir para progredirem na carreira/terem uma avaliação positiva?
Entendes aonde quero chegar? A realidade é muito mais complexa e a mudança de mentalidade vai demorar muito tempo - não se resolve isto numa geração ou em duas!
Abraços

Salpico de poesia

Levai-me para longe em sonho,
Ò som do mar,
Um vago mal-estar risonho
Me venha alhear
Da consciência do momento
Que, definida,
Paira em meu vago pensamento...
O sonho é a vida.
(Fernando Pessoa)

sábado, 28 de junho de 2008

A figura do professor-investigador

No espaço de discussão do trabalho da equipa azul, da qual faço parte, no âmbito da actividade 1, surgiu um debate opondo aquilo a que, a certa altura, chamámos de investigador-investigador (alguém que se dedica maioritariamente à investigação, um investigador profissional) ao professor-investigador.
Com o intuito de esclarecer estes conceitos, decidi ler um artigo de Hammersley com o título ‘On the teacher as researcher’. (HAMMERSLEY, M. (1993). On the teacher as a researcher. In Hammersley, M. (edt.). Educational Research – current issues (pp.211-231). London: Paul Chapman Publishing.)
Ficam aqui os apontamentos que fiz dessa leitura:

Actualmente existe uma corrente forte que defende que a investigação educacional deveria ser uma parte integrante do trabalho dos professores nas escolas e nas suas salas de aula, em vez de ser uma actividade realizada por pessoas exteriores à escola.
No entanto, esta ideia não é recente. Na década de 50 do século passado existiu um movimento significativo que defendia que os professores e os administradores deveriam desenvolver projectos de investigação-acção que contribuíssem para a melhoria das suas práticas. Corey era, na altura, um dos mais acérrimos defensores desta ideia. Acreditava, juntamente com outros teóricos, que o método científico servia para resolver problemas na área da educação e inspirava-se na obra de Dewey, que acreditava que as recomendações científicas só podem ser testadas através da prática – portanto, nesta perspectiva, o professor é um investigador que testa a teoria educacional.
Também na Grã-Bretanha a ideia do professor investigador ganhou força, nas décadas de 60 e 70, devido à reforma curricular, a ser implementada nas escolas. Com esta reforma e as dificuldades que com ela surgiram, o professor começou a ser visto como um especialista (em oposição à ideia de técnico) que reflecte constantemente sobra as suas práticas, tendo em conta os ideais e o conhecimento do contexto local. Estas reflexões deveriam, depois, traduzir-se na melhoria das práticas. [diferença entre a corrente americana e a britânica: professor que testa teoria e, a partir daí, tenta melhorar as suas práticas vs professor que reflecte sobre a sua prática, para, a partir dessa reflexão, tentar melhorar as suas práticas]
Portanto, começou a haver uma mudança de foco de atenção: dos resultados para os processos. Esta mudança foi acompanhada pela crescente utilização de métodos qualitativos (adaptados a partir da investigação nas áreas da sociologia, da antropologia e da história) – entendia-se que o método qualitativo estava mais adequado para ‘lidar’ com contextos locais específicos e os resultados eram apresentados de uma forma que podia não só ser compreendida por investigadores, mas também pelos professores, os pais e a comunidade em geral.
Um dos grandes impulsionadores destas mudanças na Grã-Bretanha foi Stenhouse, que considera que ensinar é um processo em que o professor aprende como melhorar o seu ensino. [daí também o interesse de Stenhouse no estudo de caso!!! – ver resumo de What is case study? de Bassey]
Stenhouse, citado por Hammersley (p.214), defende os seguintes pressupostos para este ‘novo’ professor:
‘- the commitment to systematic questioning of one’s own teaching as a basis for development;
- the commitment and the skills to study one’s own teaching;
- the concern to question a to test theory in practice by the use of those skills;
- readiness to allow others to observe your work and to discuss it with them on an honest, open basis.’
Deste modo, Stenhouse defende que existe uma diferença entre o professor-investigador e o investigador profissional [o ‘nosso’ investigador-investigador’]. O primeiro deve desenvolver estudos de caso baseados numa atitude colaborativa. O segundo deve desenvolver investigações no sentido de elaborar teorias gerais.

Quais são, então, as principais críticas que os defensores do professor-investigador fazem à investigação educacional convencional?
Hammersley (p.215) apresenta quatro que, dependendo do autor, se revestem de maior ou menor importância:
‘1- That it is largely irrelevant to the practical concerns of teachers.
2- That it is often invalid because it is separated from the object that it claims to understand: notably, the classroom practice of teachers.
3- That it is undemocratic in that it allows the views of educational researchers to define the reality in which teachers are forced to work.
4- That it amounts to a process of exploitation.’
Segue-se uma análise de cada uma das críticas:
Irrelevância:
Um dos argumentos que, supostamente, confirmam a irrelevância é o facto dos professores não lêem sobre investigação educacional ou que, quando lêem, não consideram que seja interessante (ideias defendidas por Burgess, Kemmis, Hustler, Cassidy e Cuff). Mas, segundo Hammersley, tal desinteresse não está provado e poderá ser confundido com incerteza e insegurança.
Por outro lado, o facto de os professores não parecem interessados, não retira a relevância aos novos conhecimentos da investigação educacional.
Hammersley considera que o grande problema da relevância da investigação educacional é o facto dos professores esperarem que ela forneça soluções para os problemas concretos que têm de enfrentar na sua actividade. Mas o autor considera que esta expectativa é impossível de cumprir (apesar dos investigadores, por vezes, afirmarem o contrário para garantir o financiamento das suas investigações) por duas razões:
1- O facto de um determinado problema ser investigado não garante que seja encontrada uma solução para ele. [parece um argumento óbvio, mas frequentemente esquecido!]
2- Os contextos em que os professores desenvolvem o seu trabalho são tão específicos e mutáveis, pelo que a sua acção concreta e as decisões que têm de tomar dificilmente poderão depender somente de um conjunto de regras abstractas.
Neste sentido, a investigação educacional não deve ser vista como uma fonte de soluções, mas uma fonte de informação que pode ser relevante e útil para a prática do professor. [!]
Outro argumento comprovativo da irrelevância parece ser o de que os investigadores se debruçam sobre problemas que eles próprios formulam – portanto, não são coincidentes com os dos professores.
Embora Hammersley considere que este argumento não corresponde totalmente à verdade, afirma que, mesmo que fosse, isso não seria necessariamente negativo. O valor da investigação educacional não reside somente no valor que os professores lhe atribuem – até porque não são o único ‘público’ da investigação educacional.
Hammersley, considera que muitos dos assuntos abordados pela investigação educacional, como, por exemplo, a consequência do tamanho das turmas no aproveitamento ou o cumprimento das expectativas do professor, deveriam interessar a todos os professores: ‘What teachers ought to be concerned about cannot be decided by what they are in fact concerned about.’(p.217) [uma frase forte que põe em causa a postura da maioria dos professores face à investigação educacional ‘tradicional’! – segundo este autor temos, portanto, de ‘ver mais longe!’] A (ir)relevância é uma questão complexa!
Invalidade:
Um argumento que é apresentado para sustentar a ideia da invalidade dos resultado é o facto das investigações serem desenvolvidas por outsiders. Parte-se, portanto, da ideia que só se conhece se formos parte da realidade (p. ex. como observador-participante). Hammersley refuta este argumento com ideia que todo o conhecimento é construído e, como tal, não temos conhecimento directo do mundo [!].
Segue-se a análise de mais quatro argumentos à volta da invalidade:
1- Os professores têm acesso às suas motivações, intenções, seus pensamentos e sentimentos. Hammersley contra argumenta podem não ter um conhecimento tão aprofundado de si mesmos. Além disso, têm dificuldades em analisar o contexto mais alargado, uma vez que estão envolvidos.
2- O professor, geralmente, conhece o ‘desenvolvimento histórico’ da situação e é conhecedor de informação privilegiada por acompanhar directamente toda situação. Hammersley contra argumenta que a informação que um participante tem sobre uma determinada situação está condicionada (ou até distorcida) pelo papel que nela desempenha – não tem, portanto, toda a informação.
3- O professor já conhece e tem ligações com as outras pessoas do contexto, pelo que lhe é fácil pedir informações. Hammersley contra argumenta que as ligações que o professor tem incluem e excluem pessoas – novamente, a informação recolhida não será completa. Para além disso, as relações pessoais podem condicionar/limitar as perguntas que o professor possa fazer.
4- Uma vez que os professores são actores chave nos contextos estudados, eles podem testar as ideias teóricas. Hammersley contra argumenta que há situações em que o testar de uma teoria pode entrar em colisão com as boas práticas.
Hammersley conclui que nem o professor está numa situação privilegiada, nem o investigador – ambos têm vantagens e limitações e ambos podem desenvolver trabalhos válidos.
Falta de democracia:
Segundo Hammmersley, este argumento tem por base a ideia de que os investigadores académicos são mais apoiados nas suas investigações, têm mais hipóteses de divulgação do seu trabalho e, consequentemente, são mais ouvidos.
Hammersley refuta: 1- os professores, nas escolas e nas comunidades, têm muito mais força e são mais ouvidos – a palavra escrita da investigação educacional não tem tanto poder; 2- os resultados da investigação educacional têm pouca influência sobre os decisores políticos, o que fica evidente nas decisões que estes, por vezes tomam.
Exploração dos professores:
Este argumento tem a ver com a ideia de que o investigador investiga para seu próprio interesse. Hammersley, no entanto, diz que o investigador tem sempre de pedir e negociar autorização para poder fazer os seus estudos e, mesmo com autorização, pode correr o risco de que esta lhe seja retirada.
Outro argumento tem sua base na ideia de que o investigador apresenta o conhecimento do professor como sendo seu. Hammersley, no entanto, alerta para o facto de haver sempre um added value, por parte do investigador, que é difícil de medir, mas que fundamental para os resultados da investigação.

Os defensores do professor-investigador não criticam somente a investigação educacional convencional – também criticam a ideia de ensino como transmissão de conhecimento. O ensino tradicional deveria, assim, ser substituído por uma pedagogia mais próxima do processo investigativo, o que exige uma abordagem diferente aos conteúdos curricular e uma postura de constante reflexão e melhoria por parte do professor.
Neste sentido, Stenhouse considera que, tanto o professor como o aluno assumem o papel de investigadores.
Hammesley defende que os defensores do professor-investigador estão a cair num paradoxo: por um lado reduzem o professor e o aluno ao mesmo papel, por outro querem promover o profissionalismo do professor.
Além disso, o autor questiona-se até que ponto o acto de ensinar deve ser visto como um questionamento e reflexão e de que tipo de questionamento estamos a falar – nem todo o questionamento, nem toda a reflexão são investigação, nem tão pouco garantem, por si só, a qualidade dos seus resultados. Pode-se, inclusivamente, correr o risco do intento investigador se sobrepor ao acto de ensinar, o que pode ter consequências negativas.

Algumas das conclusões do autor são:
1- a actividade do professor-investigador pode ser útil, mas não substitui a investigação educacional convencional.
2- existe um paradoxo entre o modelo de ensino defendido (professores e alunos como investigadores) e a promoção e a valorização do profissionalismo do professor.
3- Não se pode confundir o papel do professor-investigador, que é valioso dentro do seu âmbito, com o do investigador profissional , valioso noutro âmbito. A confusão entre ambos seria negativa, tanto para a investigação como para o ensino.


Comentário: Trata-se de um artigo muito crítico em relação ao papel do professor-investigador. Penso que a intenção do autor não é diminuir o papel do professor-investigador em relação ao do investigador profissional – antes considero que Hammersley sentiu necessidade de desconstruir alguns argumentos dos defensores do professor-investigador, com que parecem tentar defender os resultados destes como mais valiosos e verdadeiros do que os da investigação convencional.
No fundo, penso que devemos ter em mente que os objectivos de um e do outro são diferentes. O que me parece é que, tanto o professor-investigador como o investigador profissional são fundamentais e, sobretudo, complementares em investigação educacional.